No auge da pior crise de seus quatro anos e meio de governo, a presidente Dilma Rousseff desafiou os que defendem sua saída prematura do Palácio do Planalto a tentar tirá-la da cadeira e a provar que ela algum dia "pegou um tostão" de dinheiro sujo.
"Eu não vou cair. Eu não vou, eu não vou. Isso aí é moleza, é luta política", disse a presidente nesta segunda-feira (6), durante entrevista exclusiva àFolha, a primeira desde que adversários voltaram a defender abertamente seu afastamento do cargo.
Apesar do cerco político que parece se fechar a cada dia, Dilma chamou os opositores para a briga. "Não tem base para eu cair, e venha tentar. Se tem uma coisa que não tenho medo é disso", afirmou a presidente, acusando setores da oposição de serem "um tanto golpistas".
Com dedo indicador direito erguido, foi mais enfática: "Não me atemorizam". A presidente tirou o PMDB da lista de forças políticas que tentam derrubá-la. "O PMDB é ótimo", disse Dilma, esquivando-se de responder sobre o flerte de figuras do partido com a tese do impeachment.
Dilma descartou a hipótese de renúncia e comentou o boato disseminado na internet, e prontamente desmentido por ela, de que havia tentado se matar. "Eu não quis me suicidar na hora que eles estavam querendo me matar lá [na cadeia, durante a ditadura militar], a troco de que eu quero me suicidar agora?".
Folha - O ex-presidente Lula disse que ele e a sra. estavam no volume morto. Estão?
Dilma Rousseff - Respeito muito o presidente Lula. Ele tem todo o direito de dizer onde ele está e onde acha que eu estou. Mas não me sinto no volume morto não. Estou lutando incansavelmente para superar um momento bastante difícil na vida do país.
Lula disse que ajuste fiscal é coisa de tucano, mas a sra. fez.
Querido, podem querer, mas não faço crítica ao Lula. Não preciso. Deixa ele falar. O presidente Lula tem direito de falar o que quiser.
A sra. passa uma imagem forte, mas enfrenta uma fase difícil.
Outro dia postaram que eu tinha tentado suicídio, que estava traumatizadíssima. Não aposta nisso, gente. Foi cem mil vezes pior ser presa e torturada. Vivemos numa democracia. Não dá para achar que isso aqui seja uma tortura. Não é. É uma luta para construir um país. Eu não quis me suicidar na hora em que eles estavam querendo me matar! A troco de quê vou querer me suicidar agora? É absolutamente desproporcional. Não é da minha vida.
Renúncia também?
Também. Eu não sou culpada. Se tivesse culpa no cartório, me sentiria muito mal. Eu não tenho nenhuma. Nem do ponto de vista moral, nem do ponto de vista político.
A sra. fala que não tem relação com o petrolão, mas está pagando a conta?
Falam coisas do arco da velha de mim. Óbvio que não [tenho nada a ver com o petrolão]. Mas não estou falando que paguei conta nenhuma também. O Brasil merece que a gente apure coisas irregulares. Não vejo isso como pagar conta. É outro approach. Muda o país para melhor. Ponto.
Agora excesso, não [aceito]. Comprometer o Estado democrático de direito, não. Foi muito difícil conquistar. Garantir direito de defesa para as pessoas, sim. Impedir que as pessoas sejam de alguma forma ou de outra julgadas sem nenhum processo, também não [é possível].
O que acha da prisão dos presidentes da Odebrecht e Andrade Gutierrez?
Olha, não costumo analisar ação do Judiciário. Agora, acho estranho. Eu gostaria de maior fundamento para a prisão preventiva de pessoas conhecidas. Acho estranho só.
Não gostei daquela parte [da decisão do juiz Sergio Moro] que dizia que eles deveriam ser presos porque iriam participar no futuro do programa de investimento e logística e, portanto, iriam praticar crime continuado. Ora, o programa não tinha licitação. Não tinha nada.
A oposição prevê que a sra. não termina seu mandato.
Isso do ponto de vista de uma certa oposição um tanto quanto golpista. Eu não vou terminar por quê? Para tirar um presidente da República, tem que explicar por que vai tirar. Confundiram seus desejos com a realidade, ou tem uma base real? Não acredito que tenha uma base real.
Não acho que toda a oposição que seja assim. Assim como tem diferenças na base do governo, tem dentro da oposição. Alguns podem até tentar, não tenho controle disso. Não é necessário apenas querer, é necessário provar.
Delatores dizem que doações eleitorais tiveram como origem propina na Petrobras.
Meu querido, é uma coisa estranha. Porque, para mim, no mesmo dia em que eu recebo doação, em quase igual valor o candidato adversário recebe também. O meu é propina e o dele não? Não sei o que perguntam. Eu conheço interrogatórios. Sei do que se trata. Eu acreditava no que estava fazendo e vi muita gente falar coisa que não queria nem devia. Não gosto de delatores.
Mesmo que seja para elucidar um caso de corrupção?
Não gosto desse tipo de prática. Não gosto. Acho que a pessoa, quando faz, faz fragilizadíssima. Eu vi gente muito fragilizada [falar]. Eu não sei qual é a reação de uma pessoa que fica presa, longe dos seus, e o que ela fala. E como ela fala. Todos nós temos limites. Nenhum de nós é super-homem ou supermulher. Mas acho ruim a instituição, entendeu? Transformar alguém em delator é fogo.
Tem gente no PMDB querendo tirar a sra. do cargo.
Quem quer me tirar não é o PMDB. Nã-nã-nã-não! De jeito nenhum. Eu acho que o PMDB é ótimo. As derrotas que tivemos podem ser revertidas. Aqui tudo vira crise.
Parece que está todo mundo querendo derrubar a sra.
"O que você quer que eu faça? Eu não vou cair. Eu não vou, eu não vou. Isso é moleza, isso é luta política. As pessoas caem quando estão dispostas a cair. Não estou. Não tem base para eu cair. E venha tentar, venha tentar. Se tem uma coisa que eu não tenho medo é disso. Não conte que eu vou ficar nervosa, com medo. Não me aterrorizam."
E se mexerem na sua biografia.
Ô, querida, e vão mexer como? Vão reescrever? Vão provar que algum dia peguei um tostão? Vão? Quero ver algum deles provar. Todo mundo neste país sabe que não. Quando eles corrompem, eles sabem quem é corrompido.
Colaboraram NATÁLIA CANCIAN e JULIA BORBA, de Brasília
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Neste trecho, a presidente disse que "vai fazer o diabo" para que a recessão econômica seja a menor possível neste ano e revelou que o governo prepara medidas fiscais para compensar as mudanças feitas pelo Congresso no pacote elaborado por sua equipe econômica para reequilibrar as contas. Afirmando que "nunca imaginou" que a economia brasileira poderia ter uma retração acima de 1% do PIB (Produto Interno Bruto) neste primeiro ano do seu segundo mandato, a presidente afirmou: "Até o final do ano vou fazer o diabo para fazer a menor [recessão] possível. Já virei um pouco caixeiro viajante, vou continuar".
A presidente Dilma reconhece ter cometido erros no seu primeiro mandato (2011-2014), mas não coloca na lista as pedaladas fiscais -pagamento de contas do Tesouro Nacional por bancos públicos. "Eu não acho que houve o que nos acusam", afirmou a petista sobre a análise que o TCU (Tribunal de Contas da União) está fazendo sobre as pedaladas fiscais.
FONTE: FOLHA DE SÃO PAULO